Thursday, January 25, 2007

Os Gatos

Que graça quando se movem,
Que olhar tão puro.
Quão dócil o seu chamego,
Quando me acarinham
Mostrando-me o seu apego.
Sempre presentes,
Sempre fieis,
Sempre verdadeiros.
São os primeiros
A sentir o que me vai na alma,
E a transmitir-me a calma,
Que me amacia,
Que me adoça.
O que de mim seria,
Sem o seu miminho,
Tão quentinho,
Quando preciso de calor,
Para me afagar o coração
Suplicante, e
ávido de amor.
Que alegria,
Quando regresso a casa.
O espaço enche-se de luz,
De vida, de cor.
Sim, são os meus gatos,
Que me aliviam da dor,
Que me preenchem a alma,
Dos dias vazios,
Das noites frias,
E das vigílias, sem fim.
Ai, mas um olhar vosso,
Tão doce e sincero,
É tudo o que quero,
Para voltar a mim.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2007

Carla Mondim

Friday, January 19, 2007

Um olhar posto no horizonte

Um olhar posto na linha do horizonte
Procura-te, deseja-te, anseia-te.
Não te encontras lá, porém.
Estás longe, distante.
Esse olhar que te procurou volta-se para dentro,
E refugia-se nas cores do seu mundo interior.
vagueio pelo desfiladeiro dos sentimentos q me precipitam na entropia,
Que me sugam a energia vital, mas, contudo, realimento-me de esperanças.
Olho novamente o horizonte e vejo névoa,
Os meus olhos estão cansados,
A minha luz trémula.
Volto a mim, reencontro-me, vivo no mundo das ideias, do abstracto.
Fortaleço-me para te continuar a procurar, a procurar-me,
Porque tu tens uma parte de mim, que te ofereci,
Que te dediquei.
Sou fraca, porém sou forte quando me encontro contigo,
Nos teus braços, no teu calor, no teu olhar.
Olho para ti atravessando-te para me encontrar.
Tens algo que me pertence,
Que quero resgatar,
Mas que não te quero tirar,
Porque é teu o que te dei
Com a suavidade do desprendimento
De quem dá com o coração.
De dentro volto o meu olhar para o exterior.
Estou frágil, mas quero caminhar
Para a luz do sol que se adivinha lá ao longe,
Para o calor que me promete fechar as feridas
De quem vive sem ter medo de dar.
Vejo uma promessa
E com a simplicidade de uma flor ao desabrochar
Abro-me para o que tens para me dar.

Lisboa, 21 de Dezembro de 2006

Carla Mondim

Ocaso

Passam os dias
E o que antes me enchia o coração
Está vazio de ti.
Que nostalgia
Dos momentos em que se anunciava um encontro,
Um enlaçar de braços,
Um sorriso trocado olhos nos olhos.
Deixei de sentir a adrenalina do toque,
A sofreguidão do beijo,
A necessidade de misturar o meu suor com o teu.
Ficou a solidão do abraço,
O olhar sombrio perdido na linha do horizonte.
Estou perdida, sem rumo.
Sem forças para caminhar
Em direcção ao sol,
Porque não nasce, como dizem, todos os dias,
É o ocaso.

Lisboa, 10 de Janeiro de 2007

Carla Mondim

Uma nota ao vento

Era noite escura.
Fazia frio e o vento agitava as folhas das árvores.
Entrei no teu mundo, era acolhedor e familiar o espaço que nos envolvia.
Havia uma lareira acesa
E uma gata a ronronar pela sala.
Havia a opacidade do teu olhar,
Que não consegui vislumbrar.
Onde estás por detrás da pessoa banal que representas e queres tanto ser?
Não és banal, talvez sejas superficial,
Mas avaro do que têm para te dar.
Sinto urgente o teu apelo,
O teu grito esgota-se no silêncio
Que se estrangula na tua garganta.
É difícil conseguires preencher o vazio das noites sem ovações.
Estás perdido e queres encontrar-te.
Vives no limite, mas por isso não vives o que é simples.
Queres mais e não percebes que é a vida que reclama mais de ti.
Lá dentro há uma janela para um mundo
Que imaginas que te traz o êxtase,
E que te faz contar e até quase vivenciar
Aqueles lindos quadros que cantas.
Por vezes, num laivo de irreverência
contra um mundo que não te dá o que queres
traças um risco enérgico sobre a tela que pintaste.
Estás cansado, eu sei...
Mas tens dentro de ti a canção
Que vais sempre querer evocar
Naquelas outras que são o espelho baço
Daquilo que queres mostrar ao mundo.
Tens muito para dar, e é sempre tão pouco o que pensas que te dão.
Não, não sabes, dizes tu,
Nem sequer me tocaste.
Eu sou mais, muito mais.
Quero mais.......

Lisboa, 21 de Dezembro de 2006

Carla Mondim

Embriagada

De volta a mim, depois de uma viagem pelas trevas,
Regresso ao aconchego do lar.
A noite transforma-se em dia,
A tempestade em acalmia.
Os meus olhos distinguem agora,
com clareza,
As finas linhas das flores, o ar fresco da manhã,
O leve calor dos raios do sol.
O ciclo da vida retoma o caminho do mar
E o movimento constante das ondas murmura-me aos ouvidos
Uma cantiga de encantar.
Vivo o presente com a expectativa de que algo bom está para acontecer...
De que amanhã continuarei a viver
Com vontade de acordar,
Com a vontade de me embriagar
De ti, do teu olhar a cantar
As melodias que impõem o ritmo
Do meu coração a bater mais forte.
Quero anunciar ao mundo que estou viva,
Que sou uma força que se integra
Neste mundo sempre a girar
Que não pára esta dança,
Sempre a rodopiar,
Mas que não cansa
A doce esperança
De viver com o coração a bater
Por ti.

Lisboa, 28 de Dezembro de 2006

Carla Mondim

Abandono

Perco o olhar num horizonte sem fim
De um fim de tarde tépido.
As cores quentes do rosa e do azul celeste,
A esmorecer,
Apaziguam-me o espírito.
A tranquilidade dual do oceano irreverente
Transporta-me numa viagem
Que me dá asas.
Voo, vivo um sonho,
Leio poemas nas flores,
Sinto música no ar.
Sorvo a vida num instante,
Como a chama do amante
No leito que deita o pecado.
Tudo é perfeito na sua definição de ser,
Tudo pode ser amado.
Até a natureza morta...
O amarelecer das folhas,
Convidam a um olhar parado
Sobre o segredo que vive atado
Na sua vida quase a morrer.
Vivo o sonho, vivo o encanto,
Sem a dor do pranto
Em que me revolvo
Quando não consigo chegar a ti.
Mas hoje está sol,
E ao longe um farol,
Avisa-me que,
em dias de tempestade.
Estará lá,
para me conduzir ao meu porto seguro.
Por isso me abandono,
Ao sabor do fruto maduro
Do teu abraço.

Lisboa, 19 de Janeiro de 2007

Carla Mondim

A rasgar

Faz frio cá dentro.
A noite é de uma escuridão densa.
Não há luar,
Não há estrelas no céu a brilhar.
O mar está calmo.
Na tristeza da luz inexistente,
Ao longe, um raio
Rasga o negro pintado no céu.
Acende-se uma chama
Que corta orgulhosa o ar gélido.
Abre-se uma fenda
Permanente.
A lacerar,
A romper, bem devagar,
Sempre a cortar,
A sulcar,
A terra que grita fértil
Pela semente
Que quer plantar.
Quer crescer algo dentro dela,
Que ainda é pequenina
Como a luz de uma vela
Que reclama ar
Para se alimentar.
Dá-me ar, dá-me ar!
Senão morre cá dentro
Sempre a gritar,
A esperança que te quer abraçar.
Dá-me ar, dá-me ar!

Lisboa, 29 de Dezembro de 2006

Carla Mondim